O hospício de Barbacena existia desde o início do século XX e não havia critérios médicos para as internações. Cerca de 70% dos pacientes não tinham diagnóstico de doença mental. Eram epilépticos, homossexuais, alcoólatras, meninas que eram abusadas sexualmente e engravidavam, inimigos políticos de pessoas influentes na sociedade. Marginalizados.
Ao adentrarem o Colônia, as pessoas viviam experiências degradantes e desumanas. Dormiam em camas de palha infestadas de animais, faziam suas necessidades em qualquer lugar por falta de local apropiado, bebiam água do esgoto ou urina, eram espancados e violados. Milhares morriam de frio ou desnutrição, doenças causadas pelas pessimas condições. Tratamentos de eletrochoque eram recomendados, em alguns dias esse procedimento era tão forte que derrubava a rede elétrica da cidade. Muitos indivíduos eram submetidos à cirurgias de lobotomia ( no cérebro), esse tratamento era usado para conter a agressividade. Quem passava por ele e sobrevivia ficava com sérias sequelas permanentes ou vegetava pelo resto da vida. Uma quantidade considerável de corpos de pacientes eram vendidos a faculdades de medicina pelo Brasil. Outras vezes esses corpos eram decompostos em ácido.
Na década de 60 a realidade do hospício foi mostrada em uma reportagem que de início comoveu o país mas logo foi esquecida.
Apenas a partir de 1970 foi que denúncias foram levadas ao meio médico por iniciativa do psiquiatra Ronaldo Simões que defendia o tratamento humanizado. Suas denúncias possibilitaram que o pioneiro da luta antimanicomial, Franco Basaglia, conhecesse o hospital colônia e desse visibilidade mundial ao caso.
Com o intenso debate, projetos de lei foram propostos e em 2001 finalmente a lei antimanicomial trouxe regras de proteção a pessoas com transtornos mentais, melhorando a capacitação, acolhimento e tratamento médico.
As pessoas que ainda viviam no hospital de Barbacena foram direcionadas a casas construídas para que eles tivessem uma vida mais digna e desfrutassem de sua liberdade.
Milhares de pessoas passaram pelos portões do Colônia e tiveram suas vidas tiradas por maus tratos e negligência. Há uma enorme mancha em nosso país, mais uma de muitas. Políticos e pessoas poderosas estiveram por várias décadas compactuando com essas barbáries.
Houve uma mudança no antigo paradigma sobre a saúde mental, mas o hospício, mas o episódio de Barbacena não pode jamais ser esquecido.
Coluna da Vitória Maciel