A guerra na Ucrânia completa um ano nesta sexta-feira (24). A ofensiva ordenada pelo presidente da Rússia, Vladimir Putin, causou milhares de mortes. Além disso, milhões de ucranianos tiveram de sair de suas casas, no pior confronto na Europa desde a 2ª Guerra Mundial. Segundo dados da ONU, até 21 de fevereiro deste ano, mais de 8 milhões de pessoas deixaram a Ucrânia e se refugiaram em outros países.
Apesar da Ucrânia não fazer parte da Otan, os países que integram a Organização do Tratado do Atlântico Norte estão entre seus principais apoiadores na guerra contra Moscou. Desde o início do conflito, a Rússia foi alvo de diversas sanções. Em desvantagem contra as tropas de Putin, Kiev recebeu armas e recursos de diversos países do mundo.
A guerra já provocou de milhares de mortos e feridos, milhões de refugiados, uma crise econômica sem precedentes em décadas e rodadas de sanções nunca antes vistas pelo Ocidente à Rússia.
O conflito ainda parece estar longe do fim.
‘Maior crise de refugiados desde a Segunda Guerra’
A guerra já causou milhares de mortes, mas nenhum dos lados está divulgando dados militares oficiais.
Em 13 de fevereiro de 2023, 7.199 mortes de civis e 11.756 feridos haviam sido registradas na Ucrânia, segundo o Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (OHCHR).
No entanto, a organização disse que “acredita que os números reais são consideravelmente maiores, pois o recebimento de informações de locais onde ocorreram intensos confrontos foi atrasado e muitos relatórios ainda precisam ser comprovados”.
Desde a invasão russa, o alto-comissariado da ONU para refugiados (Acnur) registrou que cerca de 7,7 milhões de refugiados viajaram da Ucrânia para vários países da Europa — incluindo até mesmo a Rússia.
A população total da Ucrânia antes da guerra era de aproximadamente 44 milhões. Estima-se que quase sete milhões de ucranianos estão deslocados internamente — morando longe de suas casas.
A maioria dos refugiados fugiu para Rússia, Polônia, Alemanha e República Tcheca.
A ONU diz que se trata do “movimento populacional forçado mais rápido desde a Segunda Guerra Mundial”.
Embora muitas pessoas tenham retornado a cidades como Kiev após a contra-ofensiva ucraniana, o governo do país pediu aos refugiados que não voltassem para casa até a primavera.
Eles esperam que o clima mais quente coloque menos pressão sobre a rede elétrica, que foi duramente atingida por ataques de drones e mísseis.
Muitos refugiados ucranianos, principalmente mulheres e crianças, foram calorosamente recebidos em países da Europa.
Mas, com o avanço da guerra e também da crise inflacionária global, autoridades na Alemanha e em outros países começam a se perguntar por quanto tempo poderão abrigar refugiados.
Martina Schweinsburg, uma vereadora na Turíngia, na Alemanha, disse que no início da guerra o seu distrito abrigava ucranianos com ajuda voluntária de proprietários privados de imóveis — mas que agora muitos já não querem ajudar.
Usar ginásios escolares para acomodar refugiados emergencialmente está se tornando cada vez menos popular perante a opinião pública.
“Nossas capacidades estão esgotadas”, disse ela. “Estamos sob pressão.”
Muitos refugiados ainda levam uma vida difícil mesmo longe da zona de guerra — tendo que construir uma vida nova em um país diferente, ainda com traumas do conflito e saudades de quem ficou para trás.
“Os refugiados da Ucrânia estão ansiosos para trabalhar em seus países de acolhimento, mas precisam de apoio adicional e de mais inclusão nas comunidades onde estão hospedados”, alertou o Acnur em setembro.
Especialistas em direitos humanos da ONU expressaram sérias preocupações em outubro, dizendo “que mulheres, crianças, idosos e pessoas com deficiência foram colocadas em situações extremamente vulneráveis”.
Martin Griffiths, subsecretário-geral da ONU para Assuntos Humanitários e coordenador de ajuda de emergência, disse em um comunicado recente que “a guerra continua causando morte, destruição e deslocamento diário, e em uma escala impressionante”.
E o alto-comissáario da ONU para Refugiados, Filippo Grandi, pediu aos líderes da União Europeia em fevereiro de 2023 que “reafirmem a solidariedade e o apoio a todos os refugiados”.
A mudança nas armas usadas e nos países que as fornecem
Uma das maiores mudanças desde o início da guerra é no armamento usado no conflito e também em quem o está fornecendo aos envolvidos.
A Rússia é o segundo maior exportador de armas do mundo e, no início da guerra, seus militares pareciam em tese muito mais poderosos do que os da Ucrânia.
Mas, passado um ano, mais de 30 países forneceram equipamento militar a Kiev.
“Vladimir Putin esperava que a Ucrânia aceitasse passivamente as ações de seu vizinho mais poderoso, sem envolvimento significativo de outros países. Esse grave erro de cálculo levou a um conflito prolongado, aparentemente sem fim à vista”, disse Barbara Zanchetta, do Departamento de Estudos de Guerra da King’s College London à BBC.
Milhares de armas portáteis Nlaw, projetadas para destruir tanques com um único tiro, foram fornecidas à Ucrânia ao longo do conflito.
Elas foram fundamentais para impedir o avanço russo em Kiev nos primeiros dias da invasão.
Desde então, grande parte dos combates na guerra ocorreu no leste do país, onde a Ucrânia obteve ganhos devido ao uso de armas de longo alcance.
Os EUA, Reino Unido, Canadá e Austrália forneceram obuses M777 e sistemas de foguetes como o M142 Himars.
Autoridades dos EUA dizem que — depois das sanções internacionais — a Rússia se viu obrigada a depender de países como a Coreia do Norte, de quem teria comprado milhões de foguetes e projéteis de artilharia para usar na guerra. Tanto Rússia como Coreia do Norte negam isso.
A Ucrânia teve acesso a armas precisas de longo alcance que teriam fundamentais em suas operações bem-sucedidas no leste e no sul.
Sistemas ocidentais avançados também têm sido importantes para fortalecer a Ucrânia contra ataques aéreos russos.
Desde o início do conflito, a Ucrânia usava baterias de mísseis terra-ar da era soviética, como as S-300.
Mas elas foram complementadas por uma série de armas ocidentais, incluindo o Nasams (Sistema Nacional Avançado de Mísseis Superfície-Ar) dos EUA e os SLMs IRIS-T da Alemanha, bem como sistemas menores como o Starstreak do Reino Unido.
Em dezembro, Washington anunciou que supriria a Ucrânia com o avançado sistema de mísseis Patriot. A Alemanha e a Holanda fizeram o mesmo. Dependendo do tipo de míssil, a arma pode ter alcance de até 100 km.
Mas, em outras partes da guerra, a Ucrânia sente que precisa de ajuda mais rápida.
Embora tenha recebido veículos de combate de infantaria como Strykers e Bradleys no início da guerra, a Ucrânia não tem recebido tanques de seus aliados.
Uma coalizão de países concordou só no mês passado em enviar blindados pesados. Primeiro foi a Grã-Bretanha, que doou Challenger 2s; depois os EUA, com os M1 Abrams; e finalmente a Alemanha, com os Leopard 2s.
A decisão de Berlim pode ser desencadear outras doações, pois permite que outros usuários dos Leopards de fabricação alemã — como a Polônia — também forneçam seus tanques.
Ben Barry, do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (ISS), disse à BBC que os tanques ocidentais farão diferença na guerra, mas alertou que é improvável que as promessas feitas até agora sejam o suficiente para vencer o conflito. Segundo ele, a história prova que apenas tanques não vencem guerras.
Essas notícias provocaram reações em Moscou. O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, alertou que novos suprimentos de armamento ocidental “levam a uma escalada significativa” e outros países “se tornam diretamente envolvidos no conflito”.
É esse temor de aumento das tensões que impede os aliados da Ucrânia de fornecer caças, apesar dos pedidos cada vez mais constantes de Kiev.
Os drones também estão tendo grande destaque no conflito. Muitos vêm sendo usados desde o início da guerra para vigilância e direcionamento.
A empresa de defesa turca Baykar vendeu – e até doou – alguns de seus conceituados TB2s para substituir os que a Ucrânia perdeu nos combates.
Nos últimos meses, a Rússia usou um grande número de drones “kamikaze” (junto com mísseis de cruzeiro) para atacar cidades e usinas ucranianas.
Embora o Irã tenha dito que forneceu drones a Moscou apenas antes do início da guerra, acredita-se que tenha fornecido secretamente centenas de outros drones durante o conflito.
Via BBC