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Presença de acompanhante e sedação: saiba quais são os direitos da mulher durante o parto

A Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) afirma que "todas as mulheres têm direito ao mais alto padrão possível de atenção à saúde, incluindo o direito a uma assistência digna e respeitosa durante toda a gravidez, parto e puerpério, assim como o direito de estar livre da violência e discriminação".

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Na última segunda-feira, um médico anestesista foi preso após ser acusado de estuprar uma paciente enquanto ela estava sedada e passava por um parto no Hospital da Mulher Heloneida Studart, em São João de Meriti, no Rio de Janeiro. O ginecologista e obstetra César Fernandes, presidente da Associação Médica Brasileira (AMB) e professor de titular de ginecologia da Faculdade de Medicina do ABC, classifica o ato como uma “monstruosidade praticada por um indivíduo desqualificado, que deixou não só a sociedade, mas a classe médica indignada”.

Infelizmente, violências contra a mulher no que talvez seja seu momento de maior vulnerabilidade não são incomuns. Basta lembrar do fim do ano passado, quando o ginecologista Renato Kalil foi acusado de violência obstétrica, assédio e crimes sexuais por diversas pacientes. Segundo dados da pesquisa Nascer no Brasil, coordenada pela Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP-Fiocruz), apenas metade das mulheres dá à luz de acordo com as boas práticas obstétricas.

Mas afinal, quais são essas práticas e quais são os direitos da mulher no momento do parto?

Em posicionamento sobre a qualidade na assistência ao parto e cuidado seguro e respeitoso da saúde materna e fetal, a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) afirma que “todas as mulheres têm direito ao mais alto padrão possível de atenção à saúde, incluindo o direito a uma assistência digna e respeitosa durante toda a gravidez, parto e puerpério, assim como o direito de estar livre da violência e discriminação”.

A entidade reforça ainda que abusos, maus-tratos, negligência e desrespeito durante o parto, “equivalem a uma violação os direitos humanos fundamentais e são repudiados com veemência”.

Acompanhante

A Lei Federal n° 11.108/2005, conhecida como a Lei do Acompanhante, garante que a gestante tenha direito a um acompanhante, designado por ela, durante todo o período de trabalho de parto, parto e pós-parto. O acompanhante pode ser pode ser qualquer pessoa de confiança, como o pai do bebê, o parceiro atual, a mãe, um(a) amigo(a), ou outra pessoa de sua escolha. A parturiente também pode optar por não ter acompanhante.

De acordo com a anestesista Mônica Maria Siaulys, diretora médica do Grupo Santa Joana, não há nenhum cenário em que seja recomendado que o acompanhamento saia do local. Apenas se a paciente ou o acompanhante desejarem.

Durante a pandemia, muitos serviços passaram a restringir esse direito, sob o argumento de que isso proporcionava o aumento do risco de Covid-19. Na ocasião, autoridades de saúde como a Organização Mundial da Saúde (OMS) expressaram a importância e necessidade das parturientes terem seu direito assegurado.

Na Nota Técnica 9/2020, o Ministério da Saúde pasta expressou que “o acompanhante, desde que assintomático e fora dos grupos de risco para Covid-19″ deveria ser permitido.

Tipo de parto

De acordo com o ginecologista e obstetra Cesar Fernandes, presidente da Associação Médica Brasileira (AMB), a gestante tem todo o direito de escolher o tipo de parto.

— A grávida deve ser respeitada em todas as suas vontades e desejos, na medida do possível, em benefício de sua saúde e do recém nascido — afirma Fernandes.

Isso é definido no que é chamado “plano de parto” e, em princípio, o médico deve seguir esse plano. A cesária eletiva, por exemplo, pode ser realizada a partir de 39 semanas de gestação, se for desejo da mãe.

Segundo Fernandes, se a paciente optou por fazer parto normal, a cesárea só deve ser realizada se houver justificativa para isso. O que inclui constatação de sofrimento fetal ou quando o tamanho da pélvis da mãe não permite a passagem do crânio do bebê. Se isso ocorrer, a gestante deve não apenas ser informada, como consentir com o procedimento.

Anestesia

Um parto seguro e sem dor é direito da mulher e o anestesista está lá para garantir isso. As práticas mais utilizadas são a anestesia peridural e a raquianestesia. Durante o parto normal, receber analgesia, que corresponde à aplicação de anestésicos para que ela não sinta dor, fica a critério da mulher. Em geral, é utilizada a peridural, que controla a dor mas não tira a força.

Na cesárea, a aplicação da anestesia é necessária, já que será feita uma cirurgia. Por outro lado, não há necessidade de sedação. Isso deve ser usado mediante raríssimas exceções, como a pedido da própria paciente ou mediante condições em que a ausência de sedação coloque a criança ou a mãe em risco. Mesmo nestes casos, a mãe deve não apenas sem informada, como consentir.

As diretrizes médicas para o parto também abordam a “hora de ouro” do bebê, ou seja, a primeira hora de vida fora do útero. Estudos mostram que nesse momento, o contato pele a pele com a mãe é especialmente benéfico e os exames tradicionais do recém-nascido podem aguardar um pouco. É importante, inclusive, que ele seja amamentado nessa hora, facilitando todo o processo depois.

Assim, logo após o nascimento, o bebê deve ir para o peito da mãe e não levado para fora da sala de parto.

— Sedação não é uma prática comum em paciente obstétrica — afirma a anestesista. — O primeiro contato do bebê com a mãe é muito importante e precisa ser preservado — complementa.

Intervenções justificadas e injustificadas

Em posicionamento sobre a qualidade na assistência ao parto e cuidado seguro e respeitoso da saúde materna e fetal, a Febrasgo defende que toda gestante tem direito a tomada de condutas médicas corretas e atualizadas e à prática de intervenções comprovadamente benéficas para mãe e para o feto.

  • Ocitocina: o uso de soro com medicamentos como a ocitocina, por exemplo, usada para para acelerar o parto, pode ser necessário, mas apenas em situações específicas, como se as contrações uterinas estiverem lentas. Segundo Fernandes, o medicamento é necessário na minoria de casos.
  • Episiotomia: o corte realizado entre a vagina e o períneo, durante o parto normal, pode ser necessário. Mas a indicação não é comum. Segundo Fernandes, há necessidade de realizá-lo em apenas 10% dos partos.
    — Em 90% dos casos, não há justificativa para a prática. Mas, se houver, o médico precisa explicar para a mãe o por que ele acredita que o procedimento será necessário e ela precisa concordar com isso. Nada pode ser escondido da mãe e do acompanhante, tudo deve ser feito com clareza — afirma o obstetra.
  • Manobra de Kristeller: a compressão no fundo da barriga para empurrar o feto em direção ao canal de parto para que o parto ocorra mais rápido era uma prática aceita no passado, mas hoje é “absolutamente condenável”, segundo Fernandes. Pode haver ruptura do fígado e do útero.
  • Ponto do reparo: o ponto na vagina após o parto normal também ficou conhecido como “ponto do marido” porque alguns médicos davam mais pontos que o necessário para “apertar” o canal vaginal, que teria sido alargado após o parto. Isso teria como objetivo aumentar o prazer masculino durante o sexo, daí o nome. Atualmente, o “ponto do marido” é totalmente contraindicado. Entretanto, se episiotomia, a sutura é necessária, mas na medida certa.

— É inaceitável qualquer tipo de violência no ambiente médico hospitalar, quanto mais quando falamos no parto, que é um momento único na vida da mãe, do bebê e de toda a família. Isso é imperdoável. Existem protocolos a serem seguidos. A equipe de saúde deve ser treinada e devidamente orientada — conclui a ginecologista Marianne Pinotti, do grupo de cirurgia oncológica e mamária da Beneficência Portuguesa, em São Paulo.

Por O Globo

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