Texto: Vitória Maciel
A votação do projeto de lei 490/2007 que prevê o Marco temporal de demarcação de terras indígenas que estivessem efetivamente ocupadas até a promulgação da constituição de 1988 tem gerado inúmeros debates de diversos grupos sociais.
Mas de que forma isso afeta as populações indígenas e significa um completo retrocesso?
Com a própria CF/88 e o reconhecimento da necessidade de demarcação de terras indígenas, muitos grupos que temiam violência e repressão ao tornarem públicas suas identidades culturais, passaram a se declarar como tais. Com isso um novo conceito surgiu: a noção de territorialização. Isso significava um processo de reorganização social, formando unidades socioculturais pelas suas peculiaridades, criação de lutas políticas e uma reelaboração de sua cultura e identidade sobre sua ancestralidade. Muitas culturas indígenas tinham vínculos territoriais com determinado local e que foram cortados por inúmeros fatores, entre eles as mudanças constantes, morte de chefes e expulsão por perseguição de latifundiários, e a partir do instrumento jurídico favorável à demarcação terras fez com que muitos agrupamentos ocupassem esses espaços que consideravam como intrinsecamente ligados ao seu passado.
Porém, essa construção de identidade desagradou os grandes latifundiários e exploradores de terras, que viam a demarcação como uma grande ameaça para sua hegemonia econômica e social. Não é novidade as expulsões de indígenas de suas terras por interesses sociopolíticos, massacre de comunidades e inúmeras tentativas de silenciamento. Os povos indígenas sofrem constantemente isso e estão muito longe de conquistarem seu espaço político autônomo em busca de liberdade para exercerem sua cultura de forma plena. O Marco temporal definitivamente significa um completo retrocesso, prejudica comunidades que se reorganizaram após 1988, e está de acordo com os interesses da grande elite agrária que já atua com enorme violência contra indígenas no Brasil.
Mas o que falta no país para que aja uma maior participação de indígenas na elaboração de legislações de os afetam diretamente? O que falta para a valorização dessas sociedades que tanto contribuíram para a construção do Brasil? Talvez a resposta já seja conhecida, mas afinal, não é tão simples reparar centenas de anos de escravidão, extermínio e repressão.